terça-feira, 31 de março de 2020

Ele chegou: Confirmado o primeiro caso na minha cidade de corona

Lembro de mim, há dias atrás, fora de quarentena, ainda desacreditada do que poderia acontecer...
Deitada no divã, na minha terapia, dizendo: "O dia em que confirmar um caso em Marília daí acho que vou surtar. Sou fóbica!" Disse com tom óbvio e quase displicente pra terapeuta.
O silêncio da sessão me deixou continuar a dizer coisas a mim mesma.
Prossegui.
Eu não sei e estou com preguiça de fazer cálculos sobre quando isso aconteceu.
Porque eu não sou mais aquela Daniela.
Desde então crises de choro, ansiedade, compulsão por informação, calma na condução da conduta dos meus pais, apreensão na conduta com os meus pais mas sem dizer nada, orientação direta na conduta dos meus pais.ias e dias, manhãs angustiadas, noites preocupadas e me perguntando: Como vou fazer para suportar tudo isso!?
Hoje sei que O TUDO ISSO está na minha mente.
Mas também está fora dela.
Depois desses dias veio a notícia de casos suspeitos em Venceslau.
Veio também a notícia de UTI completamente ocupada em Venceslau.
Depois veio a notícia de Prudente não querer receber pessoas de Venceslau.
E em seguida meu irmão visitando meus pais ou meu pai indo ao mercado: O mundo ruindo e ele indo ao mercado.  E eu chorei, muito, pela conduta deles, mas logo depois fiz uma ligação com um esporro dizendo: "Eu não vou ligar, porque se aviso, a chata sou eu!"
E depois de uma crise de ansiedade que me acordou junto com uma diarréia (emocional) no último sábado e que me fez virar a madrugada achando que tinha me contaminado e que todos os  programas disponíveis, inclusive festa do Big Brother Brasil que tanto gosto eram insuportáveis e não superavam minha angústia... decidi: psicotizar.
Me abrir na minha negação, distanciamento, cindir. Impedir que a angústia dos meus pensamentos invada meu ser antes que qualquer vírus.
Decidi reduzir o contato com o facebook que jorra transmissão e violência.
Decidi reduzir as leituras sobre o incontrolável vírus.
Decidi assistir filmes, séries e entendi: A gente assiste as séries pra fugir também.
Nos abrigamos em séries a conta gotas.
Fizemos contato com amigos.
Tentamos.
Mas hoje, hoje chegou o primeiro caso confirmado.
Eu não sei bem quantos outros virão, só sei que muitos.
Eu não sei bem quantas mortes vão me abalar, mas espero que sejam algumas apenas.
Eu não sei bem o que vai acontecer, só tenho pedido diariamente para que passe por tudo isso de um modo suportável.
E tenho pedido para que de algum modo eu esteja protegida das consequências mais sérias, comigo e com quem é muito importante pra mim.
Hoje sinto a ameaça real.
Ele está aqui. Não que eu não soubesse. Mas ele está, confirmadamente.
Agora não é fantasia. Fobia. Imaginação.
Ele está.
E eu sei que daqui quinze dias, a Daniela que pode escrever aqui terá percepções diferentes, mas por hoje penso:
1. Que confio no Ministro da Saúde e seu raciocínio técnico de segurar a contaminação com solicitação de isolamento social. Acredito em sua determinação de preparar serviços públicos para o que virá. Como servidora pública sinto que nos organizamos melhor após o impacto da notícia de que estávamos em estado de calamidade.
2. Penso que estou fazendo o possível para não me expor e tenho fugido de muitas formas de qualquer exposição.
3. Queria muito conseguir sair um pouco do ambiente de trabalho no prazo de 15 a 20 dias (que acredito ser quando o caos começará a se instalar) pra estar ainda mais protegida.
4. Queria que em algum momento entendessem que meu trabalho não é essencial e posso fazê-lo de casa. Queria mesmo.
Mas também sei que essas expectativas talvez não se cumpram. Tudo muda o tempo todo.
Tal como a mutação desse invisível que me assusta.
Por hoje estou razoável com a notícia.
Veremos o que a minha mente vai produzir a partir de agora.
Veremos...


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