quarta-feira, 27 de julho de 2016

Sobre o filme Nise da Silveira: no coração da loucura

Um soco na boca do estômago. Essa foi a primeira expressão que me veio a cabeça quando vieram os créditos finais do filme "Nise: No coração da loucura".
O filme chacoalha qualquer pessoa, mas é um tapa necessário para acordar dentro de nós, o sentido de trabalhar com saúde mental no Brasil. Mas por quê, Daniela?
E eu respondo.
Primeiro a situação: o filme embora aguardado não fora selecionado pelos dois grandes cinemas de rede da cidade.
Sendo então apresentado em sessão única, hoje, no recém inaugurado Teatro Municipal de Marília.
Segundo detalhe da situação, a exibição resultou de uma parceria entre um grupo de profissionais de saúde mental, secretaria de cultura municipal e Conselho Regional de Psicologia.
Agora fora o contexto revolucionário para Marília... tem o filme!
Cheguei cedo, peguei meu ingresso em troca de um kg de alimento, e às 19:30 estava ali para alimentar minha alma, da sétima arte que como qualquer pessoa que me conheça sabe: não sou fã.
Aliás, vamos combinar, só paraliso minha vida por 130 minutos (mais ou menos) se for pra reorganizar meu mundo quando saio do cinema, senão... fico em casa.
E essa característica os filmes que Carlos ama (de super heróis) não têm.
Lá fui eu.
O filme começa com a Nise (fortemente encenada por Glória Pires) tentando entrar na instituição onde trabalha: Hospital psiquiátrico no Engenho de Dentro (RJ) em 1944!
Ao ver ela esmurrando a porta, numa simbologia sutil de adentrar a instituição que claramente se fecha a quem chega, vc já sente o clima, que em seguida já tira o fôlego numa explicação teórico-prática sobre eletroconvulsoterapia que segue a cena de entrada.
A partir daí o filme traz do caos de instituições psiquiátricas à beleza sutil e forte vivenciada por qualquer profissional que se disponha a acompanhar alguém em sofrimento mental.
Óbvio que, como qualquer profissional que ouse trabalhar com saúde mental, Nise sofre uma sequência de ataques motivados pelo incômodo que causa seu trabalho, que questiona o pré estabelecido.
Mas também se delicia com os ganhos que presencia na existência dos "considerados farrapos humanos" quando vivem uma vida maior, mais criativa e com mais sentido do que antes de adentrarem o hospital.
Não tem como não se emocionar.
Não tem como não sorrir com as tiradas dos "clientes". Não tem como não me lembrar das vezes em que fui 1/100 (isso mesmo, um cem avos) de Nise da Silveira e fui questionada. Nem tem como esquecer das vezes em que me calei, mesmo achando que devia questionar, por proteção.
Não tem como a gente não imaginar quantos seres humanos neste momento não são atendidos com respeito e dignidade. Nem tem como esquecer dos que não tem alcance para compreender um exemplo como da Nise e vivem vidas e práticas empobrecidas.
Não tem como pensar que a rotina também empobrece minhas ações.
E que precisava ser mais Nise e menos Ford (orgulhosa da minha produção).
Também ao fim do filme repetia a mim mesma: "Que bom que estou aqui, vendo  esse filme tão lindo!" E ao mesmo tempo pensava: "Não queria outra profissão na vida, por mais dura e incompreendida que está seja. Sou muito feliz por ser psicóloga!"
Valeu Nise da Silveira por me lembrar através do seu exemplo que há muito por fazer, mas este é o caminho que quero seguir.
Taí, meu mundo se reorganizou quando saía do teatro. Amei!
Aaaah e o filme termina assim: SPOILEEEER!
Imagina! Procure vc, descobrir do que é capaz uma baixinha arretada e revolucionária como Nise! ;)

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